MURO DE BERLIM
Ignácio de Loyola Brandão
O que produziu este muro, tão controvertido? Quando começa a história toda? As acusações partem dos dois lados, Estados Unidos e Rússia. Em Yalta, 1945, os quatro aliados decidiram de comum acordo a divisão quadripartida de Berlim, levando em conta sua importância histórica e o símbolo que representava para o povo alemão. Afirma-se que os soviéticos não assinaram os acordos muito a gosto. Afinal, Berlim estava inteiramente dentro do seu território, deveria ser sua sem maiores discussões. Os ajustes nunca foram fáceis, as arestas sempre existiram e à medida que os norte-americanos começaram a se distanciar, as coisas se complicaram. Logo em seguida à vitória, os russos imediatamente procederam ao desmonte de mais de quatrocentas usinas, procurando reconstituir em seu país o potencial industrial, seriamente danificado com a guerra. Setenta por cento das empresas localizadas em Berlim foram "exportadas", ocasionando um primeiro atrito entre EUA e URSS. Esta, por sua vez, acusou seu aliado de não cumprir com rigor o acordo de desmilitarização da Alemanha, o que também era verdade. Norte-americanos não andavam tão interessados nisso, com o olho no futuro. Com Truman, em 1947, delineiam-se fortemente os contornos da guerra fria. O esquema era: as potências ocidentais tinham medo da crescente influência soviética na Europa e necessitavam de um aliado leal para se opor a isso. Uma troca: a América ajuda a Alemanha a se reconstruir, a Alemanha auxilia a América a conter o comunismo. O plano Marshall derramou milhões de dólares nas zonas de ocupação inglesa, francesa e norte-americana, mais tarde território da RFA. Em 1948, os três aliados fizeram uma reforma monetária em seus territórios, visando incluir a Alemanha ao sistema econômico ocidental. Era a separação. A reação soviética não se fez esperar. Retiraram-se do comando aliado de Berlim e bloquearam a cidade por terra, além de cortarem todo o suprimento de eletricidade. Única ligação possível: via aérea. Os historiadores acreditam que a partir deste instante Berlim se tornou definitivamente dividida. Até então, esta divisão era, vamos dizer, abstrata. Sabia-se que estava passando de um setor para outro, do mesmo modo que, no Rio de Janeiro, percebemos as diferenças da Zona Norte e Zona Sul. A tensão cresceu. Com o btoqueio, os aliados ocidentais tiveram que estabelecer uma ponte aérea para abastecer a cidade. Operação fantástica: durante 322 dias foram realizados 277.728 vôos que transportaram 1 milhão e 600 mil toneladas de alimentos. A cada 24 horas, subiam ou aterrisavam 1344 aviões, a base de
Levantado o bloqueio, quase um ano depois, já havia duas cidades. As ligações telefônicas foram cortadas. Mais tarde, em 1953, as linhas de bondes e ônibus mudaram. Os passageiros iam até os limites das zonas de ocupação, desciam, tomavam outra condução, algumas quadras além. Os veículos particulares viviam sob intensa regulamentação. Só quem andava a pé podia circular livremente. Os problemas se agravaram com a revolta de 17 de junho de 1953. Insatisfeitos com o aumento excessivo das normas de produção para os trabalhadores, os operários se levantaram,
Durante quase dois anos e meio o muro se conservou fechado, ninguém atravessava. A partir de
Uns o chamam de "o muro da vergonha". Muito utilizado para a propaganda do sistema capitalista. Tenho a sensação de que se os russos não erguessem o muro, os norte-americanos dariam um jeito de fazê-lo. Convém. Basta dar uma espiada no Museu do Muro, à saída do Checkpoint Charlie. Está tudo lá, conservado: os balões, os minisubmarinos, os carros adaptados, as ferramentas com que abriram túneis, enfim as centenas de expedientes usados pelos que atravessaram o muro, por cima, ou por baixo. Para mim o museu é apenas mostra da criatividade humana em qualquer circunstância. O homem inventa, se arranja, escapa. Quem não está contente e atingiu limites insuportáveis, sempre dá um jeito. Daí a surpresa, às vezes, dos sistemas totalitários quando vão além da tensão suportável.
Hoje também o muro é chamado o "maior mural para grafitis do mundo". Ao longo dos seus
Na verdade existem dois muros. Entre os dois, um espaço estéril, plantado por obstáculos de concreto, esteiras de pregos ponteagudos, um sistema de filamentos que aciona foguetes de alarme, uma via afastada para os veículos de segurança, e as guaritas, a cada cem metros, de onde os soldados vigiam constantemente com os binóculos assestados para o lado ocidental. Em Berlim vão te dizer que naqueles binóculos existem câmeras fotográficas. Fosse assim, a RDA seria a maior consumidora de filmes do mundo. Também vão te dizer que neste espaço o campo é minado. O escritor Peter Schneider que estudou por anos o assunto (...), garante de pés juntos que não há minas.
Texto extraído de: BRANDÃO, Ignácio de Loyola. O verde violentou o muro. São Paulo: Global. 1984, p. 36-39.
A Cinemateca em janeiro apresentou uma mostra de filmes da Alemanha Oriental das décadas de 60 e 70. São filmes de grande qualidade (quase todos foram censurados, mas alguns conseguiram furar a censura e foram sucesso de público). Com críticas à burocracia e à falta de perspectica para os jovens, os filmes dão um panorama do regime. Há um filme curioso que não foi terminado por que a censura não deixou que mostra um jovem operário em férias perambulando pelas ruas de Berlim e encontrando a namorada e os amigos. Isto é, "vagabundeando", tudo que os comunistas odiavam. Os censores disseram que o filme não propunha nada de positivo e assim ele foi banido e só foi apresentado ao público após a queda do Muro. Na Alemanha Ocidental a censura era econômica e durante as décadas de 60 e 70 não se produziu nada de qualidade. Somente na década de 70 surgiu o Cinema Novo alemão. Pena que o público da Mostra fosse mínimo. Foi um desperdício.
ResponderExcluirFausto Barreira
Li em seu blog a matéria sobre o Muro de Berlim. A Cinemateca em janeiro apresentou uma mostra de filmes da Alemanha Oriental das décadas de 60 e 70. São filmes de grande qualidade (quase todos foram censurados, mas alguns conseguiram furar a censura e foram sucesso de público). Com críticas à burocracia e à falta de perspectica para os jovens, os filmes dão um panorama do regime. Há um filme curioso que não foi terminado por que a censura não deixou que mostra um jovem operário em férias perambulando pelas ruas de Berlim e encontrando a namorada e os amigos. Isto é, "vagabundeando", tudo que os comunistas odiavam. Os censores disseram que o filme não propunha nada de positivo e assim ele foi banido e só foi apresentado ao público após a queda do Muro. Na Alemanha Ocidental a censura era econômica e durante as décadas de 60 e 70 não se produziu nada de qualidade. Somente na década de 70 surgiu o Cinema Novo alemão. Pena que o público da Mostra fosse mínimo. Foi um desperdício.
ResponderExcluirFausto Barreira